terça-feira, 6 de abril de 2010

O Tratado da Correção do Intelecto, de Espinosa: considerações

O Tratado da Correção do Intelecto data de 1661, nessa época Espinosa tinha 29 anos. Muito jovem ainda para o círculo de anciãos de que se compõe a filosofia, ainda mais se considerarmos a amplitude do projeto anunciado: a correção do intelecto. Como se toda filosofia de até então se constituísse em fábulas e em equívocos da razão humana, aos 29 anos, Espinosa – um jovem desconhecido – se propõe a corrigi-la e não se intimida em face da grandiosidade dos nomes que a compõe: Platão, Aristóteles, Tomás de Aquino e Descartes, para citar alguns. Como Ulisses na morada dos Ciclopes, Espinosa não se deixa afetar pela grandeza daqueles que habitam a ilha da filosofia. O jovem Espinosa se lança, então, em sua guerra contra os disparates da razão humana, contra a religião e contra a organização da sociedade; neste Tratado que pretende curar a razão humana de seus próprios fantasmas, recriando um mundo pautado na comunidade de todos os homens, no amor para com a existência e na alegria de ser gente.

Este livro contém em germe a Ética, e nele já percebemos o caráter próprio da filosofia de Espinosa: a definição genética, a imanência, o método construtivo, a definição positiva da verdade e a noção de autômato espiritual. Neste pequeno livro são enunciadas quase todas as teses que permitiriam a Espinosa ultrapassar o cartesianismo (exceção feita à idéia de expressão) e, mais que isso, construir um sistema onde não há lugar para as sombras do negativo, do confuso e da impotência, fazendo-se notar – desde jovem – a força do pensamento de Espinosa, a força de um pensamento que é movido por sua própria potência e não pelo medo de errar. O erro, as ficções, as idéias falsas, as idéias duvidosas, não são estes os fios condutores: a verdade é encontrada por si mesma. A verdade não requer defensores externos e nem pode ser julgada a partir do que é falso. O falso, a dúvida, o negativo são perspectivas ruins para o julgamento da verdade. Tal como a luz que por si mesma se dá a conhecer, e através dela que sabemos o que é a luz e a escuridão, é através da idéia verdadeira que sabemos o que é a verdade e o falso, tal idéia se basta a si mesma e não necessita de garantia externa. Com a formulação de uma verdade imanente à definição Espinosa revoluciona a história da filosofia: o verdadeiro e o falso não devem ser julgados a partir de critérios externos. O conhecimento verdadeiro coloca os critérios para si mesmo e para o falso: a verdade não necessita de defensores, nem mesmo de Deus. Com esse Tratado Espinosa cura a razão humana dos critérios externos a si mesma, critérios segundo os quais ela aparecerá sempre carente de apoio, negativa. À correspondência do pensamento à coisa, Espinosa responde com a produção da definição pelo intelecto, com a proposta de um intelecto são e gerador de definições verdadeiras. A idéia não é verdadeira por ser adequada, mas o inverso, é adequada por ser verdadeira. Ao isolamento político do indivíduo, Espinosa propõe a comunidade de todos e a relação entre todas as idéias verdadeiras. À mutilação dos universais, propõe a construção do singular e do simples. À razão duvidosa, confusa e negativa, Espinosa propõe a alegria do conhecimento verdadeiro, adequado e afirmativo. O Tratado da Correção do Intelecto é, assim, uma espécie de abertura – e que abertura! – e preâmbulo para a sua obra mor: a Ética. Embora seja uma obra inacabada e sem dar maiores desenvolvimentos às suas propostas, o Tratado da Correção do Intelecto já permite antever o que viria: um sistema filosófico dos mais sofisticados e estruturados – senão o mais sofisticado – da história da filosofia. O Tratado da Correção do Intelecto é um livro audacioso nas suas pretensões e nos seus resultados, escrito por um jovem filósofo de 29 anos e ainda desconhecido, um livro pequeno (cerca de 26 pg.) e inacabado que possui em germe a força para afrontar mitos milenares da razão humana.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

2000 anos depois...



Sábado de Aleluia


E o rancor cristão


Ainda se vinga de Judas